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Estado de Minas ENTREVISTA | FLÁVIO ROSCOE

Primeiro semestre de nova gestão da Fiemg tem balanço positivo

O mais jovem presidente da instituição vem promovendo uma verdadeira revolução


postado em 10/12/2018 18:01 / atualizado em 10/12/2018 18:14

(foto: Alexandre Rezende/Encontro)
(foto: Alexandre Rezende/Encontro)
O vento da mudança trazido pelas urnas chegou mais cedo à sede da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), na avenida do Contorno. Em maio, a entidade que representa 138 sindicatos - um setor que arrecada 48,6% de tudo o que se paga de imposto em Minas Gerais - elegeu o mais  jovem presidente de sua história. Aos 47 anos, recém-completados em outubro, Flávio Roscoe, presidente do grupo Colortextil, não chegou de mansinho. Trouxe logo uma ventania. Em seu primeiro dia de trabalho já apresentou uma completa proposta para modernização do sistema Fiemg.  Em seis meses de gestão, implementou 150 projetos, atingindo todas as áreas da federação. Um dos alvos é zerar o déficit operacional, que chegou a 150 milhões de reais em 2017. O quadro de pessoal foi reduzido em quase 15% e Roscoe optou por cortar forte na alta hierarquia (dos 18 superintendentes, ficaram cinco). Entre as medidas que causaram mais reboliço está o fechamento, a incorporação e fusão de escolas do Senai e Sesi, responsáveis por formar mão de obra para a indústria. De 10 a 12 escolas deixarão de funcionar neste ano, de um total de 192. "Eram espaços subaproveitados. Fecharemos o ano com uma alta de 8% no número de alunos, não cortamos em nossa atividade-fim", garante. Direto e bem-humorado, ele comenta sem meias-palavras até temas considerados espinhosos, como a reforma da Previdência, principalmente do funcionalismo público: "Se a reforma da Previdência não for feita, não precisa fazer coisa alguma, pois nada mais resolve neste país". Para 2019, Roscoe, industrial do ramo têxtil, aposta na retomada da confiança e no crescimento de Minas. Ele conversou com Encontro na sede da Fiemg, às 3 da tarde de uma quarta-feira, e aproveitou parte do tempo da entrevista para almoçar. Sempre assertivo, só hesitou na hora da sobremesa. Nesse ponto, ele ficou dividido entre a sugestão da mulher, Geraldine Nogueira, que recomenda frutas, e uma musse de limão com cobertura de chocolate meio amargo. Optou pelo doce. Nesse caso, os cortes (de calorias) ficaram para outro dia.

  • Quem é: Flávio Roscoe Nogueira, 47 anos

  • Origem: Belo Horizonte (MG)

  • Carreira: Em abril foi eleito presidente da Fiemg, que representa 139 sindicatos e 64 mil indústrias em Minas. Tem mandato até 2022. Atua como dirigente na entidade há 16 anos. É sócio-diretor do grupo mineiro Colortextil, fundado por sua família e um dos principais fornecedores de malhas do país. Entre os cargos que já ocupou estão o de diretor da Fiemg, presidente do Conselho Fiemg Jovem e da Câmara da Indústria do Vestuário e Acessórios da entidade. Também foi membro do Conselho de Indução ao Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais (Coind) e do Conselho de Administração da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT). É presidente do Sindicato das Indústrias Têxteis de Malhas no Estado de Minas Gerais (Sindimalhas)

ENCONTRO - Quando o senhor assumiu a presidência, algo o surpreendeu?

Flávio Roscoe - Eu participo da entidade há muitos anos, portanto não tive muitas surpresas. Tinha um conhecimento profundo. Cheguei ciente daquilo que precisava ser mudado e logo no primeiro dia começamos a implantar um conjunto de projetos para modernização da entidade. Temos 150 projetos em andamento, em todas as áreas de atuação do sistema Fiemg. Em todos eles, há um foco muito grande na defesa de interesses dos empresários e um permanente diálogo com a sociedade. A indústria é sócia da sociedade. Se a sociedade vai mal, a indústria vai mal, e o contrário também vale. Queremos uma entidade mais produtiva, em sintonia com o momento atual, em que há uma redução de orçamento nas famílias e nas instituições.

Qual a situação do caixa da federação hoje?
Havia um déficit operacional e um déficit de caixa, em função também de volumes de investimentos, de aproximadamente 150 milhões de reais em 2017. Vamos encerrar o primeiro semestre de nossa gestão com um superávit de 80 milhões de reais.

Entre as medidas para aumentar a produtividade e equilibrar as contas está o fechamento de escolas consideradas subaproveitadas...

Até o final deste ano, teremos o encerramento, entre Sesi e Senai, de 10 a 12 unidades, de um total de 192 no estado. Com objetivo de aumentar a produtividade e racionalizar recursos, encerramos algumas unidades que não tinham muita demanda, mas mantinham a mesma estrutura de uma escola cheia. Mesmo com esse corte de custos, vamos formar um número de alunos 8% maior que em 2017. Vamos entregar mais para a comunidade, mais formação com menos recursos.

"Se a reforma da Previdência não for feita, não precisa fazer coisa alguma, pois nada mais resolve neste país" (foto: Alexandre Rezende/Encontro)
Um prédio ocupado pela Fiemg próximo à sede da entidade também teve o aluguel cancelado. Estava ocioso?
Como fizemos cortes de pessoal, houve vacância. Assim, reorganizamos a estrutura de forma mais enxuta. Focamos os cortes nas atividades-meio. Mexemos, por exemplo, com o pessoal de apoio. Houve cortes também em áreas de comunicação, administração e na alta hierarquia. Reduzimos o número de superintendentes de 18 para cinco. O quadro foi reduzido em 850 pessoas, em um total de 6,4 mil, lembrando que não houve cortes em nossa atividade-fim. Isso pode ser visto com o crescimento de alunos atendidos.

O Minas Trend, salão de negócios da indústria da moda, é deficitário. Qual a perspectiva para os próximos anos?

O Minas Trend teve já neste ano uma redução de 70% em seu déficit. O patrocínio da Fiemg foi reduzido de 5 milhões para 2 milhões de reais. Isso sem onerar o participante, já que o preço do estande para o expositor foi reduzido em 20%. No ano que vem, a nossa perspectiva é de que o evento se desenvolva sem déficit.

O Fiemg Coin, nova moeda virtual da casa, vai ajudar no projeto de maior produtividade e redução de custos?

A partir da criação do Fiemg Coin, todas as empresas que solicitarem nossa assessoria terão o serviço gratuito, mas terão de fazer o pedido por meio dos sindicatos, usando o Fiemg Coin. Dessa forma fortalecemos a ação dos sindicatos e conseguimos precificar os serviços prestados, além de medir a demanda que temos pelas áreas. O que ocorria antes é que estávamos atendendo escritórios de advocacia e contabilidade. Após receber nossa assessoria, eles cobravam da indústria por seus serviços. Com o Fiemg Coin, a demanda foi reduzida em 80%.

A Fiemg vem trabalhando para auxiliar o novo governo de Minas. Como o senhor examina a possibilidade de uma novidade aqui em Minas?
Vejo com muitos bons olhos. A mudança é sempre positiva e o discurso do governador, do Novo, é muito alinhado com o nosso. O objetivo da Fiemg é contribuir com o novo governo. Estamos à disposição para ajudar no que for possível no desenvolvimento de Minas Gerais, e é esse papel que nós temos exercido na transição. A Fiemg não está participando da equipe de transição, mas tem contribuído com informações e projetos.

Como o senhor vê as diversas propostas de o governo ficar com parte dos recursos arrecadados para o Sistema S? De fato, há sobra de recursos?
Não há sobra nenhuma, há falta. Prova disso é que encontramos na entidade um déficit operacional de 150 milhões de reais. Eu vejo com muita cautela essa ideia, porque até agora não vi nenhuma proposta boa. Veja bem, se fosse isentar as indústrias, poderia até se pensar, mas não é isso o que se propõe. O que se fala é em transferir para o governo recursos que as indústrias pagam para treinamento de sua mão de obra. Se não tiver o Sistema S para treinar, para dar educação básica, quem fará isso? Não tem ninguém. E como formar mão de obra para nossas indústrias? Hoje, 72% dos cursos são totalmente gratuitos. Setenta por cento dos recursos que vêm de forma compulsória são convertidos em bolsas gratuitas para treinar mão de obra. Os serviços oferecidos pela indústria em Minas atingem quase 200 mil pessoas ao ano. Temos escolas de educação básica, ensino médio e profissionalizante, cursos específicos para certas funções, além de clubes, museus, centro de inovação e tecnologia, tudo isso mantido com esses recursos.

O senhor também criticou a proposta do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a abertura unilateral da economia...
Felizmente o ministro Paulo Guedes mudou de opinião e não fala mais da abertura unilateral. É um crime contra os brasileiros o Brasil abrir o seu mercado e os outros países não fazerem o mesmo. O custo Brasil tem uma série de impostos ocultos e indiretos, uma sobrecarga que nós pagamos e o produtor lá de fora não paga. A abertura unilateral, se fosse mesmo levada adiante, mataria toda a indústria.

Mas há uma crítica muito contundente ao imposto de importação...
O imposto de importação é regulatório. No Brasil é um pouco mais alto que nas economias desenvolvidas, mas muito em linha com aqueles países de linha intermediária, como o Brasil. Esse imposto vai para o governo. São 32 bilhões de reais ao ano. Se esse imposto acaba, terá de ser criado algo para substituir. Se for retirado o imposto sobre o produto importado, o brasileiro vai pagar isso de alguma outra forma. É disso que ninguém fala.

"Eu vejo com muita cautela as propostas para o Sistema S, porque até agora não vi nenhuma proposta boa" (foto: Alexandre Rezende/Encontro)
Essa questão não se equilibra com o crescimento da economia?
O que gera economia não é produto importado que entra aqui. Para citar um exemplo, o Paraguai está crescendo porque está desenvolvendo a produção local. Quando só havia produtos importados, como era a economia do país? O que gera o fortalecimento da economia é a indústria que emprega. A indústria é responsável por 48,6% de tudo o que se paga de imposto em Minas Gerais.

O senhor é a favor da proteção para a indústria nacional?
Eu não chamo de proteção. A indústria nacional não precisa de proteção nenhuma. Precisa de condição isonômica de competição. Não adianta eu concorrer com quem tem condição totalmente diferente da minha, e é isso o que eu disse para o ministro Paulo Guedes: "Primeiro, o senhor tira todos os absurdos que a indústria aqui é obrigada a pagar e vamos discutir um processo de abertura mais rigoroso". A alíquota média do imposto de importação para produtos industriais está entre 12% e 13%. No entanto, entre obrigações e impostos ocultos que só existem no Brasil, chegamos a 16% do custo industrial. Então, temos uma proteção efetiva negativa de 3%. Precisamos corrigir essas distorções, mas, para isso, são necessárias várias reformas. Não se resolve em uma canetada.

A redução na taxa de juros é sempre uma grande demanda do setor produtivo. O que o senhor espera para os próximos anos?
Ninguém fala, mas o grande problema da economia brasileira é a indexação. O salário, os aluguéis todos têm reajuste previsto em contrato. Enquanto não desindexar, teremos um dos juros mais altos do mundo. Todo ano temos uma inflação que está prevista contratualmente. Quem não tem preços indexados coloca juros enormes, e isso impede que haja crescimento da demanda. Dessa forma o Brasil não cresce.

O senhor acredita que a reforma da Previdência se viabiliza já no início do novo governo federal?

A Previdência pública está dragando os recursos da sociedade brasileira como um todo, tanto nos estados como na União. A reforma é urgente, e eu a dividiria em duas: a Previdência geral e a Previdência pública. A pública atinge um número menor de pessoas, mas tem um impacto muito maior nas contas públicas. Se a reforma da Previdência não for feita, não precisa fazer coisa alguma, pois nada mais se resolve neste país. Não se pode mais empurrar a poeira para debaixo do tapete. Não cabe mais. Quanto mais se protelar os cortes, maiores serão os cortes que virão.

Os governos têm dificuldade em mexer na Previdência porque acreditam que esse é um tema impopular...
É impopular porque é malconduzido. Na verdade, a sociedade entende que não é possível trabalhar por 30 anos e se aposentar. Em Minas, o funcionalismo está se aposentando com 48 anos, em média. Se nada for feito, em 2035 a Previdência vai consumir 35% do PIB. E aí? Vamos ter uma carga tributária de 70%? Isso mata todo o tecido social e econômico.

O senhor é otimista com a economia? O horizonte se mostra mais claro para a indústria mineira?

Vai depender muito das medidas macroeconômicas, mas estamos, sim, otimistas.  O índice de confiança dos empresários saiu de 50 para 63 pontos. É o maior salto que eu me lembro de ter visto. E confiança é tudo na economia. Confiança é a capacidade de investimento. Com maior previsibilidade no cenário político, há retomada do investimento e melhora do nível de emprego e da renda.

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