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Estado de Minas ARTE

Conheça a obra da artista plástica mineira Michelle Campos

Em suas criações, ela reflete sobre a condição das mulheres no contexto dos sistemas ditatoriais


postado em 21/08/2019 16:16 / atualizado em 23/08/2019 15:52

A artista plástica Michelle Campos:
A artista plástica Michelle Campos: "Não me atenho a uma linguagem única, apesar de o desenho e a pintura serem constantes como parte do meu processo de pesquisa" (foto: Alexandre Rezende/Encontro)
FOTO1]Nascida na cidade mineira de Divinópolis, localizada a 120 quilômetros da capital mineira, a artista plástica Michelle Campos, de 41 anos, é a caçula de cinco filhos. Temporã, tem 11 anos a menos que seu irmão mais novo. Quando ingressou na escola, os irmãos já estavam na faculdade. A família havia se mudado há pouco para Belo Horizonte e, junto com ela, vieram alguns agregados, filhos de amigos. "Em minhas memórias mais antigas, minha casa afigura-se como um misto de república de estudantes de medicina, enfermagem e serviço militar", diz ela. Lembranças vividas no contexto da ditadura militar. No colégio de freiras, onde estudou por 13 anos, as disciplinas religiosa e militar marcaram fortemente sua percepção sobre o mundo.

A ligação afetiva com o pai, advogado e fiscal aposentado, despertaram na menina o gosto pela arte. Foi nos desenhos que ele guardava de sua época de solteiro que ela se inspirou para criar os seus primeiros esboços. Retratos de atores hollywoodianos de cinema das décadas de 1930 e 1940, assim como cenas da guerra do Paraguai e jogadores do Flamengo, que permeavam o seu imaginário. Outro dos talentos do genitor era a escrita gótica, feita à mão livre, que sempre a impressionaram. Erudito, o pai compartilhava com a filha a paixão por músicas clássicas e livros de história da arte. "Dividimos muitas horas de silêncio e compreensão mútua. Por vezes, as palavras não eram necessárias". As aulas de pintura a óleo se iniciaram aos 11 anos, tendo o pai como um entusiasta de suas obras. Ofício que Michelle Campos praticou com regularidade até os 21 anos, quando abandonou o curso de comunicação social e iniciou o de artes plásticas na Escola Guignard.

Obra Redes Brancas: instalação em tecido mostra a versatilidade da artista no uso de materiais(foto: Alexandre Rezende/Encontro)
Obra Redes Brancas: instalação em tecido mostra a versatilidade da artista no uso de materiais (foto: Alexandre Rezende/Encontro)
A influência da mãe, dona de casa, também foi decisiva para traçar seu perfil artístico. "Ela sempre foi uma pessoa muito cênica, impelindo-me em uma direção mais moderna e contribuindo decisivamente para a vertente performática das minhas produções." Os primeiros trabalhos, que a artista considera como embriões do que ainda hoje ela pesquisa, tratavam das relações entre imagem e política da propaganda nazista. "Fiquei curiosa pelas implicações resultantes do arranjo específico que se deu entre palavras, imagens e imaginário, dentro daquele contexto." A proposta gerou curiosidade, tanto que, no primeiro ano na escola de arte, Mechelle foi selecionada para a exposição da Mostra Interna com um ensaio fotográfico em preto e branco em que apresentou uma versão feminina de Adolf Hitler. Por ocasião da exposição, ganhou destaque na imprensa mineira.

Na época, em meados de 2000, Michelle se surpreendeu com tamanho reconhecimento. Intensificou ainda mais a sua preocupação com a condição das mulheres no contexto dos sistemas ditatoriais. Nasceu, então, a instalação da Grande Mãe. Um trabalho plástico suscitado por suas inquietações e baseado nas referências literárias de George Orwell, com o Grande Irmão, do romance 1984, e o mito pré-histórico da Grande Mãe Terrível, citado no livro, Personas Sexuais de Camille Paglia. "Essas obras resumem a primeira fase dos trabalhos artísticos que considero como os primeiros de uma pesquisa que ainda se desenvolve", diz.

(foto: Alexandre Rezende/Encontro)
(foto: Alexandre Rezende/Encontro)
Suas obras são apresentadas em plataformas mistas, inspiradas no trabalho de artistas como o pintor e instalador francês Christian Boltanski, o cineasta Haroun Farocki, a escultora Rachel Whiteread e a pintora, gravurista e escultora alemã Käthe Kollvitz. Desenho, pintura, instalações, performance, fotografia e vídeo. Aos olhos da artista tudo vira arte. "Não me atenho a uma linguagem única, apesar de o desenho e a pintura serem constantes como parte do meu processo de pesquisa". Uma característica é marcante: a presença do preto e branco. Segundo ela, pela familiaridade com as questões políticas e históricas. E, talvez, pelas letras pretas em papéis brancos dos documentos escritos, das fotografias jornalísticas, entre outras referências. Sempre ativa e muito versátil, Michelle também publicou um livro de poemas chamado O Oco da Porcelana e atualmente atua como professora em seu ateliê e na Maison Escola de Arte.

*Leia também na edição impressa (nº 218) da Encontro

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