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Não à toa, essa é uma das músicas de louvor preferidas do padre abre-campense Alexandre Fernandes de Oliveira, com 52 anos - e 25 de sacerdócio completos em julho deste ano. Com voz serena, semblante tranquilo e leve sorriso no rosto, ele fala sobre o seu mais recente desafio, que recebeu no final de 2018: assumir uma nova paróquia após duas décadas na igreja Nossa Senhora Rainha, do Belvedere. A conversa com a equipe de Encontro se deu entre as várias reuniões do sacerdote, no escritório da paróquia Bom Jesus do Vale, que já está bem estruturada, com igreja provisória dotada de capela, salas administrativas, espaços para catequese e encontros de jovens - todos com ar condicionado - e até um café. Tudo muito diferente de como estava o espaço no fim do ano passado, quando as missas, reuniões e despachos com o padre eram feitos em um contêiner preenchido com 500 cadeiras de plástico. "Quando soube da transferência, passei por três dias de muita angústia. Imagine você trabalhando numa empresa por 20 anos e te falam que você vai ter de começar tudo de novo", conta. "Foram três dias de tristeza. Depois, decidi não olhar mais para trás. Não é esquecer o que passou, deixar de aprender com o que passou, mas não quis voltar atrás, só pensar no futuro. O sentido da vida do homem é contemplar o horizonte."

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Ainda em 2008, em meio aos quase incontáveis compromissos na Nossa Senhora Rainha, padre Alexandre idealizou outro projeto, que seria responsável pela reviravolta em sua vida. Ao perceber a necessidade de uma igreja para atender os fiéis da jovem região do Vila da Serra e Vale do Sereno, pensou em criar uma comunidade sob as asas da paróquia do Belvedere. Foi ele quem deu a ideia, reuniu moradores, propôs a criação do local, procurou empreendedores - que doaram o terreno - e reuniu voluntários que se dispusessem a se envolver. Em 2014, a comunidade foi oficialmente fundada. Por quatro anos, o espaço era usado para uma missa por semana, no domingo, às 10h, seguida de um café da manhã organizado pelos próprios frequentadores.

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A consultora imobiliária Cida Miranda, que mora e trabalha no Vale do Sereno há 20 anos, foi uma das pessoas que se prontificaram a ajudar na Bom Jesus desde o primeiro chamado. Ela estava entre os 72 fiéis presentes na reunião de fundação da comunidade e foi, aliás, quem conseguiu o escritório emprestado para o administrativo da igreja trabalhar, além de uma sala em uma galeria de arte para o encontro do Perseverança (grupo de mais ou menos 300 jovens, de 10 a 15 anos, que se reúne semanalmente e não cabia na paróquia na época do contêiner). "O trabalho que padre Alexandre faz é de pastor e as ovelhas reconhecem sua voz e vão atrás dele. Quando foi transferido, trouxe o rebanho com ele, para se juntar ao nosso grupo que já frequentava a comunidade", diz.

O sacerdote se abriu para o desafio da renovação. Em seu discurso de posse como pároco da Bom Jesus, em outubro de 2018, comparou a paróquia a um barquinho de papel "a navegar tranquilo nas águas límpidas que correm na mata aqui atrás". Na mesma missa, compartilhou com os fiéis o seu desejo - ou melhor, plano - de que ela se tornasse "embarcação para mar aberto". Padre Alexandre conta que os últimos tempos têm sido de muito trabalho, muitos dos dias com expediente de mais de 12 horas. "Mas têm sido dias felizes. Os fiéis estão empenhados em ver a comunidade crescer. Eu estou os convidando para sonhar junto", afirma.

Aliás, acompanhar o ritmo do abre-campense não é fácil. Reconhecido por bolar projetos ousados, concretizar ideias e também pelo talento de identificar o dom das pessoas, ele coloca para trabalhar todo mundo que estiver disposto a tal. "Padre Alexandre é o maior empreendedor que conheci nos últimos tempos. Poucas pessoas fazem acontecer de maneira tão rápida, tão eficiente e tão leve como ele", diz o empresário Alex Veiga, CEO da construtora Patrimar, frequentador da Bom Jesus junto com a mulher, Heloísa Veiga. "Ainda bem que ele não é incorporador, pois seria um concorrente e tanto", brinca. Alex ressalta a capacidade do sacerdote de ajudar na construção da comunidade, na orientação dos voluntários e doadores, identificando as pessoas certas para os lugares certos. "Dá o maior prazer poder ajudar, sabendo que o resultado é bem feito porque tem por trás uma liderança que sabe fazer", completa ele que, mesmo com o pé quebrado, esforça-se para ir à missa de domingo.

O projeto do templo definitivo é de Gustavo Penna, que propôs uma estrutura moderna, com uma grande janela de vidro para integrar a igreja à bela paisagem natural do entorno, um espelho d’água e uma ampla praça. O arquiteto conta que, quando foi convidado por padre Alexandre para realizar o projeto, ouviu do sacerdote o desejo de que a igreja convidasse ao convívio da comunidade. "Acho que o mais importante nele é essa fé e persistência, convicção de que tudo vai dar certo", afirma Gustavo. "Ele tem certeza de que as coisas caminham para o melhor e isso ele transfere para nós." A igreja ainda está sendo projetada, mas a ideia é que tenha 4 mil m² de área construída, capacidade para 940 lugares na nave, 220 no mezanino e 64 na capela.

Os voluntários também têm crescido em número. Hoje, são mais de 200. Passam pela paróquia aos domingos, no total das cinco missas, cerca de 2.500 fiéis. Segundo Thacio Freitas, coordenador do grupo de jovens Fanuel, o fato de a paróquia estar ainda no início fortaleceu a relação entre os frequentadores. "Fazíamos o louvor no meio da obra e os encontros aconteciam onde era possível. Isso nos trouxe um carinho muito grande, para mim e para os jovens, a questão de estarmos vendo o espaço surgir", diz.

A analista contábil Íris Duarte, que mora no Buritis, frequentava com a família a Nossa Senhora Rainha por causa do sacerdote. Sua filha mais velha, Carol, de 14 anos, fez catequese lá. Desde a transferência, eles vão à igreja do próprio bairro, porque o Vale do Sereno fica fora de mão para manter a assiduidade desejada. Desde a mudança, eles só foram à Bom Jesus três vezes. No entanto, Íris segue padre Alexandre no Instagram, faz parte da lista no Whatsapp e vê a missa pelo Youtube. "Ele tem um conhecimento impressionante e uma homilia maravilhosa. Não poderia deixar de ouvi-lo e vê-lo, ainda que não presencialmente", diz.
O trabalho social não ficou para trás com a mudança de paróquia. A Bom Jesus ajuda a Apac (Associação de Proteção e Assistência ao Condenado) de Nova Lima e, em parceria com a paróquia Mãe do Redentor, no Olhos D’Água, está construindo um ambulatório nesse bairro, nos moldes daquele do Belvedere, que deve começar a operar no ano que vem. "Quando entendemos que a comunidade paroquial não é do sacerdote, isso muda todo o sentido de como a encaramos", diz padre Alexandre. "Hoje, posso dizer que estou muito feliz aqui. Este está sendo um ano de celebração." Agora, depois de renovado, padre Alexandre colhe frutos de seus voos certeiros e se diz pronto para olhar para a frente e encarar desafios cada vez mais altos, como do templo definitivo da Bom Jesus do Vale. Exatamente como fazem as águias.
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