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Estado de Minas GASTRONOMIA

Testamos o delivery de 56 estabelecimentos de Belo Horizonte

É a terceira vez que Encontro realiza esse levantamento na capital. A boa notícia é que a maioria dos restaurantes, hamburguerias e lanchonetes fez o trabalho de casa direitinho. O serviço melhorou muito nos últimos anos


postado em 01/10/2020 00:02 / atualizado em 01/10/2020 00:02

(foto: Paulo Márcio/Encontro)
(foto: Paulo Márcio/Encontro)
Quando o bairro São Francisco era ainda uma roça, no sentido mais romântico da palavra, com casas ostentando hortas e galinheiros, dona Maria Clara Rodrigues recebia os clientes para comer seu famoso frango ao molho pardo. Eram os anos 1950 e a ida ao Bolero - então nome do restaurante - significava deixar a cidade para trás em nome de boa comida. Logo, dona Maria percebeu que muitos clientes traziam suas panelas para que, além de comer no local, também levassem a refeição para o resto da família que não tinha ido até o estabelecimento. Assim, surgiu o take away - nome moderninho para pague e leve - do Maria das Tranças, que na década de 1980 já representava cerca de 10% de toda a venda do restaurante. "Sou a terceira geração da família à frente do negócio e, no início dos anos 2000, criei o nosso delivery próprio", diz Ricardo Rodrigues, que também é presidente da seção Minas Gerais da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-MG). Naqueles tempos, 17% do faturamento da casa já vinha do take away, 20% do delivery próprio e 8% da venda por aplicativos. "Esse é uma herança da minha avó, que já enxergava lá atrás o potencial desse mercado", afirma Ricardo.

Agilberto Martins, sócio da Rede Gourmet (da pizzaria Olegário, do japonês Udon e do variado Santafé), é parceiro de vários aplicativos, mas nem por isso deixou de investir em um próprio, que leva o nome da empresa:
Agilberto Martins, sócio da Rede Gourmet (da pizzaria Olegário, do japonês Udon e do variado Santafé), é parceiro de vários aplicativos, mas nem por isso deixou de investir em um próprio, que leva o nome da empresa: "Quem tem a chance de desenvolver sua própria plataforma de vendas deve fazer isso" (foto: Samuel Gê/Encontro)
Essa é uma história rara, já que muitos bares, lanchonetes e restaurantes precisaram aprender na marra como encarar esse mundo do delivery depois de a prefeitura determinar o fechamento de estabelecimentos para tentar impedir a disseminação do novo coronavírus. Alguns não entenderam a dinâmica a tempo e precisaram fechar as portas. Segundo a própria Abrasel, cerca de 30% dos 22.000 estabelecimentos na Grande BH não voltarão a funcionar. Alguns até reabrirão, mas vão patinar e não aguentarão manter o CNPJ na ativa até o final do ano. "Acredito que o delivery não é uma tendência, porque ele sempre foi um braço importante dentro do negócio", afirma Ricardo. "O que aconteceu na pandemia foi a virada de chave para alguns empresários. Por menor que seja o percentual, não se pode desprezar canais de vendas. É preciso ouvir o que o mercado pede."

O consumidor já vinha demonstrando que pedir uma refeição em casa ou no trabalho faz parte da vida moderna. E não é só por uma questão de não ter talento ou mesmo pura preguiça de enfrentar a cozinha. É uma prática que vem crescendo ano após ano e que acabou ganhando um fôlego extra durante a pandemia. Segundo o Instituto Foodservice Brasil (IFB), o delivery triplicou durante os meses em que os restaurantes se viram sem poder receber os clientes no salão - de 9% para 32%. "Os pedidos, que aconteciam normalmente no período noturno e finais de semana, passaram a ser feitos todos os dias e em vários momentos, já que as famílias estavam em casa, principalmente as crianças", diz Ingrid Devisate, diretora executiva do IFB. "Então o delivery passou a ser não só um momento de lazer, mas também de conveniência."

Pedro Henrique Guimarães, sócio-administrador do italiano Un%u2019Altra Volta, com a mulher e sócia, Júlia Duarte:
Pedro Henrique Guimarães, sócio-administrador do italiano Un%u2019Altra Volta, com a mulher e sócia, Júlia Duarte: "Os aplicativos facilitam muito, porque assim consigo focar no meu negócio que é servir comida boa" (foto: Alexandre Rezende/Encontro)
A pandemia acelerou um processo que já vinha amadurecendo desde a chegada das plataformas de vendas de comida online. Os aplicativos reúnem em um único lugar uma infinidade de restaurantes capazes de saciar qualquer tipo de fome. Basta um toque na tela do celular e pronto: problema resolvido. Em pouco tempo, iFood, Uber Eats, Rappi e outros entraram em nosso vocabulário cotidiano. Entre esses, o mais conhecido é o iFood. Nascido em São Paulo, em 2011, é um gigante no universo do delivery. Atualmente, são 212 mil restaurantes parceiros - um avanço de 32% em relação a março, mês em que estabelecimentos pelo país inteiro começaram a cerrar as portas. Em junho, foram 39 milhões de pedidos. Parceiro do iFood, o Restaurante do Porto viu seus pedidos aumentarem de 500 para 1,5 mil por mês. O proprietário Leonardo Duarte usa a plataforma apenas para a venda dos pratos. "A entrega eu faço com motoqueiros próprios que levam nossos baús e mochilas. Assim garanto a qualidade do produto", diz. "Principalmente nesse momento, o entregador é o principal elo entre a cozinha e o cliente, então é preciso treinamento para o serviço sair perfeito", afirma ele, que aos domingos chega a ter doze motocas à disposição.

Túlio Pires lançou o aplicativo Rullus em Casa:
Túlio Pires lançou o aplicativo Rullus em Casa: "Tem gente que não sabe ligar o forno, então mandamos um vídeo ou um manual com toda a explicação de como finalizar. Inclusive, de como empratar e quais louças usar" (foto: Geraldo Goulart/Encontro)
O Uber Eats, outro player que faz a intermediação do contato entre cliente e restaurante, está por aqui desde 2016. Criado em São Francisco, nos EUA, a plataforma também percebeu mudanças de consumo durante a pandemia. "Muitas pessoas recorreram à empresa para refeições ao longo do dia e, por isso, buscavam opções mais acessíveis", explica Atajila Lima, gerente de comunicação de Uber Eats no Brasil. Surgiu o Caseirinho, com opções mais baratas. "Em uma época em que as pessoas estão incertas quanto ao futuro e atentas a seus gastos, é importante oferecer refeições de qualidade, mas mais em conta."

Nem só de arroz e feijão se vive durante a pandemia. Na contramão, a Rappi - conhecida por entregar não só comida, mas "qualquer coisa", de documentos a compras de supermercado - lançou a categoria Chefs, focada em alta gastronomia. Em Belo Horizonte, o serviço funciona em 25 estabelecimentos parceiros como Udon, D’Artagnan, Eva Cucina Originale e Caê. "Queremos mostrar que os restaurantes se adaptaram e agora também oferecem seus estrelados menus com segurança", afirma Sergio Saraiva, presidente do Rappi Brasil. Ou seja, é possível comer seu prato favorito sem nem precisar tirar o pijama, algo impensável há alguns anos. Diretor de estratégia da Rappi Brasil, Fernando Vilela diz que o consumidor também precisou mudar sua forma de se relacionar com o delivery. Se por muitos anos pedir comida se traduzia em encomendar pizza ou sanduíche, isso mudou. Redondas e burguers ainda continuam no topo da lista de preferência, mas o leque de opções cresceu (veja no quadro lista das especialidades mais pedidas em BH). Muitos restaurantes aderiram ao delivery exatamente pelo fato de encontrarem uma empresa que faça esse meio de campo com os consumidores. "Os aplicativos facilitam muito, porque assim consigo focar no meu negócio que é servir comida boa", resume Pedro Henrique Guimarães, sócio-administrador do italiano Un’Altra Volta.

Leonardo Duarte, dono do Restaurante do Porto, viu seus pedidos aumentarem de 500 para 1,5 mil por mês:
Leonardo Duarte, dono do Restaurante do Porto, viu seus pedidos aumentarem de 500 para 1,5 mil por mês: "A entrega eu faço com motoqueiros próprios que levam nossos baús e mochilas. Assim garanto a qualidade do produto" (foto: Samuel Gê/Encontro)
A Rede Gourmet, dona da pizzaria Olegário, do japonês Udon e do variado Santafé, é parceira de vários aplicativos, mas nem por isso deixou de investir em um próprio, que leva o nome da empresa. "As taxas são muito altas, podem chegar a quase 30%", explica o sócio Agilberto Martins. "Quem tem a chance de desenvolver sua própria plataforma de vendas deve fazer isso." Segundo ele, surgiram na pandemia muitas empresas informais, que apostam todas as fichas em preços baixos. "O empresário começa a trabalhar em casa e quando tenta se profissionalizar se depara com os custos dos impostos e de capacitação. Muitos quebram", diz. Para conseguir disputar com as centenas de pizzarias cadastradas, ele criou a Olé, marca mais popular da Olegário e que só existe no delivery.

O chef Remo Peluso, do Provincia di Salerno, manda para os clientes uma simpática carta e um QR Code para acessar uma playlist exclusiva com músicas clássicas italianas: para provar uma massa curtindo o tenor Luciano Pavarotti(foto: Samuel Gê/Encontro)
O chef Remo Peluso, do Provincia di Salerno, manda para os clientes uma simpática carta e um QR Code para acessar uma playlist exclusiva com músicas clássicas italianas: para provar uma massa curtindo o tenor Luciano Pavarotti (foto: Samuel Gê/Encontro)
Responsável pelos menus das festas mais caprichadas de BH, o Rullu’s Buffet viu em meio a pandemia a chance de se reinventar. Mantendo sua assinatura em alta gastronomia, passou a entregar na casa dos clientes suas receitas de dar água na boca, com muito bacalhau, camarão e lagosta. "Mandamos tudo pronto e a pessoa precisa apenas esquentar", diz o empresário Túlio Pires. "Tem gente que não sabe ligar o forno, então mandamos um vídeo ou um manual com toda a explicação de como finalizar. Inclusive, de como empratar e quais louças usar." O queijo brie acompanhado de figo e castanhas, por exemplo, precisa ir por 40 segundos no micro-ondas e pronto - está no ponto certinho para ser servido. Todos os pratos que saem da cozinha são previamente testados. Aos fins de semana, Túlio atende a cerca de 200 pedidos. O negócio deu tão certo que ele está lançando seu próprio aplicativo, o Rullus em Casa. Ali, a clientela pode escolher não só um prato, mas também um menu completo - com sugestões de entrada, prato principal e sobremesa. A entrega também merece uma atenção especial, tanto que é feita por carro. "É muito importante a apresentação, porque não entregamos comida, e sim a gastronomia Rullus."

Ricardo Rodrigues, proprietário do Maria das Tranças e presidente da Abrasel:
Ricardo Rodrigues, proprietário do Maria das Tranças e presidente da Abrasel: "O que aconteceu na pandemia foi a virada de chave para alguns empresários. Por menor que seja o percentual, não se pode desprezar canais de vendas. É preciso ouvir o que o mercado pede" (foto: Abrasel/Divulgação)
Esse é a terceira vez que Encontro realiza o Teste do Delivery. As duas primeiras aconteceram em 2011 e 2013. E a conclusão é a mesma de todos os jornalistas que pediram comida em 56 restaurantes entre os dias 21 e 30 de agosto. O serviço melhorou muito. Há melhores opções e a chegada dos apps padronizou o serviço. Claro que a experiência não é a mesma de ir até um restaurante, ser bem atendido e receber uma comida quentinha, recém-saída da cozinha. Mas os problemas como atrasos e falta de algum produto foram raros. Alguns estabelecimentos até se esforçaram para levar um pouquinho de sua essência para dentro da casa da clientela. Junto com a refeição do Provincia di Salerno veio, por exemplo, uma simpática carta e um QRCode que dava acesso a uma playlist com músicas italianas. Enquanto nosso editor, Alessandro Duarte, comia um ravioli de abóbora recheado com muçarela de búfala e espinafre, o tenor Luciano Pavarotti enchia o ambiente com a clássica Caruso. Faltou apenas a simpatia do chef Remo Peluso. Sinal de que nem tudo pode ser embalado para viagem.

Clique aqui e confira os resultados do Teste do Delivery <

Dicas para uma entrega sem coronavírus
  • Se possível, peça ao entregador para deixar o pacote em algum local e se afastar, ou mantenha distância de, ao menos, 1 metro. Sempre, claro, de máscara

  • Evite dinheiro vivo. Opte por pagamento por aplicativo ou utilize cartões de crédito ou débito

  • Depois de lavar as mãos ou limpá-las com álcool em gel, limpe as embalagens com álcool. Se possível, transfira a comida para um recipiente limpo e descarte as embalagens que vieram da rua

  • Depois de mexer nas embalagens, lave as mãos novamente e desinfete a superfície em que elas tocaram

Conheça os nossos critérios de avaliação do delivery

  • Foram avaliados 56 estabelecimentos de BH, nas categorias pizza, sanduíches, carnes, comida japonesa, comida italiana, comida mineira, cozinha variada, comida árabe, peixes e frutos do mar e cozinha internacional. O teste foi realizado entre os dias 21 e 30 de agosto

  • Os pedidos foram feitos em horários de pico, tanto no almoço, quanto à noite

  • A avaliação considerou os seguintes quesitos: tempo de entrega (se foi cumprido o tempo prometido); como chegou (temperatura, organização do pedido ao chegar, embalagem lacrada, pedido correto; e qualidade da comida)

  • No quesito tempo, as entregas feitas até 15 minutos antes ou 5 minutos depois do prazo prometido ganharam 5 estrelas. Entregas feitas depois do tempo prometido perderam uma estrela a cada 5 minutos. Aquelas feitas antes do tempo prometido perderam 1 estrela a cada 15 minutos

  • A nota máxima de cada uma das categorias é 5, representada por estrelas

  • O teste não tem validade científica

As categorias de comida mais pedidas em BH durante a pandemia

  • Burguers

  • Pizza

  • Grelhados

  • Brasileira

  • Japonesa

  • Açaí

  • Sanduíches

  • Italiana

  • Sobremesa

  • Padaria

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