
O Marco Civil da Internet, que foi sancionado pelo presidente da época, Michel Temer, é, no entanto, bastante amplo, e os acontecimentos na web extremamente dinâmicos. Sendo assim, tornou-se necessária uma legislação mais específica, sobretudo no que diz respeito ao fator privacidade, principalmente após o escândalo envolvendo a empresa Cambridge Analytica. Em 2018, a companhia americana utilizou, sem consentimento, informações de mais de 50 milhões de pessoas para direcionar propagandas políticas. Esses dados pessoais foram coletados por meio de um teste lançado no Facebook. Esse contexto foi um dos catalisadores para a criação de outra lei no Brasil, a 13.709/18, batizada de Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 17 de setembro deste ano, entrou em vigor no dia seguinte, alterando alguns pontos do Marco Civil da Internet e reforçando outros.

Márcio Lima, que acaba de assumir a liderança da área de privacidade e proteção de dados da Fiat Chrysler Automóveis, ressalta como os dados pessoais tornaram-se valiosos nos últimos anos, sobretudo com a utilização de inteligência artificial para analisar essas informações sobre usuários de internet. "Cada acesso a um site de compras, cada pesquisa realizada em sites de busca, cada post nas redes sociais gera dados e conhecimento sobre preferências e perfil do usuário", diz. "Essa coleta gigantesca de dados pessoais permite a elaboração de perfis com base nos padrões de comportamento e pode influenciar nas escolhas das pessoas. Aí começa o problema."

O diretor institucional do CEAPD, Fabrício da Mota Alves, conta que na União Europeia existem marcos regulatórios nesse sentido há, pelo menos, 15 anos. "No caso brasileiro, não tínhamos uma norma tão abrangente e unificada como a LGPD, mas leis setoriais, como o Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Acesso à Informação, assim como o Marco Civil da Internet", diz. Apesar da situação avançada da Europa nesse âmbito, o advogado Ricardo Moreira pondera que não se pode dizer que o Brasil estava atrasado com relação a outros nações: "Cada país tem suas urgências e agendas." Ele diz que o importante é ver que já temos uma lei em vigor e que o assunto está, no mínimo, entre as "top 3" prioridades das empresas atendidas no centro. A procura também é alta nos escritórios de advocacia. "Esta tem sido uma das maiores demandas que temos recebido atualmente", conta Patrícia Campos de Castro Véras, sócia do escritório Veiga, Hallack Lanziotti e Castro Véras Advogados. "Além das questões técnicas, várias questões jurídicas surgem na implementação, bem como a necessidade de elaboração de políticas, revisão de cláusulas contratuais, etc."
Para a situação de desinformação, Liz Alencar acredita que é necessária uma ampla campanha educativa patrocinada pelo poder público. A especialista aponta, ainda, outros caminhos para conscientizar a população brasileira de seus novos direitos e deveres. "Todos devemos fazer a nossa parte. Empresas podem - e devem - dar transparência e conscientizar seus clientes a respeito de seus direitos, assim como a própria OAB pode assumir relevante papel como patrona dessa causa, tanto para os advogados inscritos em seus quadros, como para a população em geral", afirma. De modo geral, os especialistas são otimistas. "Hoje, as redes sociais e os smartphones facilitaram a difusão de notícias. É questão de tempo até que a população passe a exigir seus direitos previstos na lei de forma ampla", diz Ricardo Moreira. "Vemos isso acontecendo, por exemplo, no site Reclame Aqui, no qual já há uma profusão de reclamações com o tema LGPD."