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Estado de Minas ENOLOGIA

Produtor espanhol fala sobre o mercado de vinhos no Brasil e na Europa

Especialista em enomarketing, Pablo Roger explica como a pandemia impactou o consumo em seu país e o que deve ser feito no Velho Continente para melhorar o setor nos próximos anos


postado em 03/02/2021 00:16 / atualizado em 03/02/2021 00:16

Pablo Roger:
Pablo Roger: "É preciso seguir trabalhando na especialização com o marketing, porque vinho não é como cerveja ou refrigerante. Requer uma base de trabalho para criar uma estratégia única" (foto: Raimundo Sampaio/Esp. Encontro/D.A Press)
Ele viaja pelo mundo falando sobre uvas, sobre o mundo dos vinhos, estudando a potencialidade dos mercados para a bebida e o vitivinicultor. Esclarece que não é enólogo nem sommelier. é especialista em enomarketing, um conceito inovador que busca traçar estratégias de comercialização para o setor, além de trabalhar ideias para o futuro, com foco em 2030. Mas, sem perder a essência do que considera principal: a tradição. Aos 49 anos, o espanhol Pablo Miranda Roger respeita as vinícolas como patrimônio tradicional da Espanha e bem econômico e lamenta o êxodo dos jovens que deixam o campo para estudar nas grandes cidades, como Madri.

Com a pandemia, o fenômeno foi revertido e houve um retorno às vinhas e às refeições familiares regadas a vinho. Outra preocupação desse pai de quatro filhos é o consumo consciente da bebida, que perde a preferência do público na faixa até 24 anos para os destilados. Dono de pequena vinícola e em busca de novos mercados, ele visita o Brasil há mais de uma década e encantou-se pelas oportunidades de Brasília, capital a que vem pelo menos duas vezes por ano. Percorreu videiras no cerrado e trouxe cinco rótulos espanhóis na bagagem, distribuídos para todo o Brasil pela Del Maipo Importadora.

1) Você veio a Brasília em novembro apresentar cinco rótulos espanhóis e esteve em Belo Horizonte no ano passado. Vem sempre ao Brasil? Por quê?

Eu vim a primeira vez a São Paulo em 2008, 2009, para conhecer o mercado brasileiro e começar a trabalhar nele. Em 2013, 2014, eu conheci Brasília e agora venho aqui duas a três vezes por ano. Brasília é como se fosse uma porta escondida; aqui encontrei grande capacidade de trabalho. São Paulo já é um mercado saturado e aqui há mais possibilidades. Quando fui a Minas, eu falava com meus filhos que Minas é 10% maior do que a Espanha. é como se cada estado no Brasil fosse um país, com uma oportunidade espetacular de trabalho. Já estive também em Porto Alegre, Goiânia, Belém, Salvador.

2) Você faz questão de esclarecer que não é enólogo nem sommelier. Qual é a sua função no mercado de vinhos?

Sou assessor estratégico especializado em vinícolas há 25 anos. Traço estratégias, estudo o mercado, faço enomarketing, que é um conjunto de práticas para harmonizar a produção da vinícola com seus mercados. Um dos principais focos é manter a tradição, porque as vinhas são patrimônio tradicional e um bem econômico. Na Espanha, temos um fenômeno, que é o abandono das vinícolas familiares, porque os filhos vão estudar fora, em Madri. Eu trabalho com o viticultor, porque ele é uma parte do terroir, que envolve clima, solo e trabalho. Tenho uma vinícola, a Réquiem, que está na terceira geração familiar. é pequena, com poucos trabalhadores e produz cerca de 40 mil garrafas por ano. São dois vinhos, sem aditivos e de fermentação espontânea: o Réquiem, envelhecido durante 16 meses em barril, e o Ré Minor, oito meses, uma bebida mais moderna.

3) Como a pandemia do novo coronavírus afetou a produção do vinho espanhol?

A safra de 2020 foi muito produtiva, com muita quantidade de uva na primavera. A natureza brotou sem controle, com mais pássaros e animais silvestres. Os jovens retornaram às vinhas, porque não há qualidade de vida nas grandes cidades durante a pandemia. O consumo de vinho em casa aumentou entre 15% e 20%, assim como o de embutidos e o de hortaliças. Mas, na Espanha, em geral, diminuiu 38% devido ao fechamento da rede hoteleira e de bares e restaurantes.

4) Você tem outra preocupação, que é a educação para o consumo responsável de vinho pelos jovens. Por quê?

Tenho quatro filhos, de 11, 14, 17 e 20 anos e percebo que qualquer jovem conhece bebidas destiladas e quase nada do vinho da sua própria terra. Na Espanha, 1% do Produto Interno Bruto (PIB) é representado por essa bebida que tem, geralmente, baixo teor alcoólico. Eles sabem muito sobre o gim, por exemplo. Uma pesquisa mostrou que o consumo de vinho entre pessoas até 24 anos é de 7%, enquanto os destilados atingem 44%. E eu procuro distanciar o vinho - e a tradição de tomá-lo à mesa em família - do álcool e das outras drogas. Não se deve equipará-los. é preciso uma educação sensorial e também sobre a quantidade do consumo do vinho.

5) Como vê o futuro deste mercado?

A pandemia nos obrigou a refletir, a fermentar ideias para o setor nos próximos anos. A produção na Espanha, na França e na Itália é praticamente equilibrada. São os maiores produtores mundiais. é preciso seguir trabalhando na especialização com o marketing, porque vinho não é como cerveja ou refrigerante.

6) Qual é o perfil do consumidor espanhol?

O consumidor de vinho espanhol é maior de 30 anos, tem poder aquisitivo médio a médio alto, cultiva o hábito de beber em casa e mantém uma relação importante com a gastronomia. Entre 30 e 35% da população bebem vinho e acredito que a potencialidade desse mercado pode chegar a 50%.

7) E como é o consumidor brasileiro?

O Brasil me surpreendeu, porque observo aqui um grande despertar, com um potencial de 10% da população para o mercado do vinho. Esses brasileiros conhecem a bebida porque tomam rótulos internacionais, já viajaram para Espanha, França, Itália e Portugal e demonstram interesse em aprender, em fazer cursos.

8) Quais foram os rótulos lançados em Brasília em parceria com a Del maipo Importadora e Distribuidora?

Da Bodega Réquiem, apresentamos os tintos Re Minor - uvas tempranillo, fermentação espontânea, cor púrpura intensa, aroma floral - e também o Réquiem, com notas de frutas negras e nuances torradas. Da vinícola César Príncipe, trouxemos o 13 Cántaros Nicolás, de uva tempranillo, cor cereja, aroma de frutas vermelhas, chocolate e tabaco; o César Príncipe, de uva tempranillo, aromas de baunilha, de chocolate e de canela; e o rosé frutado Charlatán, de uvas garnacha tinta.

9) Que vinícolas você visitou no cerrado?

Estive na Vinícola Brasília - iniciativa de 10 produtores do Projeto de Assentamento Dirigido PAD-DF, na BR-251 , com investimento de R$ 3 milhões, uvas syrah e expectativa de 10 rótulos. O futuro do Brasil nos próximos 15 anos passa pela produção de vinhos. é um território vasto e acredito que o país vá produzir bons exemplares.

10) Quando você era menino, o que queria ser?

Eu queria ser um comunicador. Estudei publicidade e relações públicas e viajo pelo mundo falando, por exemplo, sobre uma uva, comunicando as pequenas coisas do meu lugar para o mundo. Nasci e ainda moro em Valladolid, na região de Castilla y León (Castela e Leão), no noroeste da Espanha, e meus pais se dedicavam ao campo, tinham uma fazenda com criação de animais e agricultura.

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