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Estado de Minas BATE-PAPO

Produtor cultural Aluizer Malab fala sobre a retomada em seu setor

Responsável por trazer grandes shows a Belo Horizonte, ele garante que não parou um só minuto durante a pandemia. Diversificação foi o caminho


postado em 15/06/2021 22:11 / atualizado em 15/06/2021 22:11

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O produtor cultural Aluizer Malab, responsável por trazer grandes shows a BH(foto: Uarlen Valério/Encontro)
O produtor cultural Aluizer Malab, responsável por trazer grandes shows a BH (foto: Uarlen Valério/Encontro)
Engana-se quem pensa que Aluizer Malab, um dos principais produtores culturais do país, está enfurnado dentro de um escritório fritando a cabeça ou esperando a pandemia passar para voltar a vender os mega shows, como acontecia no mundo de outrora (ele já produziu espetáculos como de Elton John, Rod Stewart, Alanis Morissette e Beyoncé). A pandemia impactou em cheio diversos setores da economia, mas o cultural foi atingido em sua jugular, da noite para o dia, em março de 2020. O belo-horizontino que acabara de deixar o Ministério do Turismo para se dedicar ao que de melhor sabe fazer, ficou paralisado. Mas durou pouco. Em vez de seguir a corrente e nadar abraçado com as lives, ele decidiu seguir um caminho diferente. "A conta não ia fechar", diz. Diversificou. "Não quero só gerar conteúdos, quero poder abrigá-los." Mergulhou de cabeça em projetos mais sustentáveis e que independentemente da pandemia poderiam ser executados. Quando vier a retomada, Malab já terá pelo menos dois projetos engatilhados: um espaço de eventos no aeroporto de Confins e outro no Mercado Novo. Quem o conhece sabe que ele não está fazendo nada diferente do que se acostumou a fazer desde o início de sua carreira nesta área. "Estou aproveitando as oportunidades". Durante três anos pode levar a sua expertise proativa para o setor público, como presidente da Belotur (2017 e 2018) e Secretário Nacional do Ministério do Turismo (2019). Nesta entrevista, Malab, que se revela um otimista contumaz, diz que a capital mineira evoluiu bastante nos últimos anos e conseguiu forjar uma forte cadeia produtiva cultural que será imprescindível na tão esperada retomada.

ENCONTRO - Quando a pandemia aterrissou no país, você tinha acabado de deixar o Ministério do Turismo para se dedicar aos seus negócios, ou seja, os grandes eventos. Como reagiu?

ALUIZER MALAB - Vinha me dedicando ao serviço público e tentando conciliar as minhas atividades, mesmo sem estar à frente delas. Aceitei o convite para o Ministério do Turismo, mas era com prazo de validade. Pensei: agora, vou voltar para a minha atividade. E o que eu fiz foi mergulhar no trabalho. Reestruturei tudo. Aí, chegou o mês de março de 2020. Nos primeiros dias, senti um baque. Um desânimo. Não estava acreditando naquilo. Fiquei sem ação. E as pessoas ficavam especulando que no segundo semestre as coisas voltariam ao normal. Enquanto isso, pensava que 2020 já tinha acabado. Tive que tomar decisões para me manter de pé. Eu sou muito intuitivo e acredito na minha intuição. Eu comecei a rever tudo e a me reorganizar.

E a rota natural foi se enveredar para o on-line, certo?

Na minha área, vi muita gente mergulhando nas lives e pensei: essa conta não vai fechar. Não vou colocar minha energia ali. Então, meu primeiro momento foi de paralisação. Como financiar a vida diante de uma torneira fechada, sem a emissão de uma nota fiscal? Comecei a pensar em tudo. Fiz isso durante todo o ano. Aí decidi ampliar minhas áreas de atuação para além dos grandes eventos.

Como assim?

Sou empresário do Pato Fu e fui vendo que tipo de projeto a gente poderia colocar energia e que não dependesse do término da pandemia. Foi o caso do "Música de Brinquedo" para o público infantil, um projeto de audiovisual que vamos divulgar em breve. Isso nos possibilitou muito trabalho. Assumi também uma dupla de rap, a Hot e Oréia. E pude também trabalhar bastante durante o ano de 2020. E isso também não dependia do mundo exterior. Estamos também trabalhando em um novo espaço para eventos no aeroporto de Confins, que terá área aberta e fechada. Será mais um espaço para shows, com 50 mil metros quadrados de área externa. Recentemente, fechamos uma parceria no Mercado Novo, para empreender no terceiro piso. Portanto, começamos a trabalhar em novas frentes. O lema é observar as oportunidades.

(foto: Uarlen Valério/Encontro)
(foto: Uarlen Valério/Encontro)
Então, como produtor cultural, você diria que planejar e diversificar é, mais do que nunca, preciso?

É importante ressaltar que estou falando sobre a minha forma de pensar. Esse é o DNA da minha empresa e da minha personalidade. Não sei se para todos essa é a saída. Mas, para mim, tem funcionado.

É possível planejar para uma possível retomada?

A retomada me preocupa muito, desde sempre. Tudo que estou pensando, tem relação com a retomada. Para nós, da área de eventos, vai ser difícil, pois vamos estar em uma crise econômica e vamos ter de repensar tudo: do patrocínio aos tíquetes, dos protocolos à atração. A gente vinha trabalhando, no mundo inteiro, de forma muito acelerada e automatizada. Hoje, precisamos rever tudo. O planejamento será, mais do que nunca, imprescindível. Vamos ter de esperar muito, antes de sair fazendo. Pois não temos gordura para errar. A pandemia nos fez voltar para as casinhas no tabuleiro. Nesse momento precisamos investir muito no acerto. Por isso, quero estar em vários lugares neste salão. Não quero só gerar conteúdos, quero poder abrigá-los.

E como você vislumbra os grandes eventos e o cumprimento dos protocolos sanitários?

Estou estudando junto com outros pares toda a situação. Acredito que este ano vamos começar a ter mais eventos-teste. É claro que vamos ter de avançar com as vacinas também. Por que não pensar em eventos para fatias da população já vacinadas? Agora, o uso de máscara veio para ficar. Anos atrás quando via os orientais usando máscaras pensava que era um comportamento civilizado, apenas. Mas, hoje, pensando na pandemia, noto que é um reflexo de um povo que entendeu a seriedade de doenças virais, ou seja, a importância de se proteger e proteger os outros.

E como é, para um produtor cultural, lidar com esta situação? Sonha com a possibilidade de voltar a realizar eventos presenciais?

É algo maior do que a retomada de eventos. Depois dessa tristeza, a gente merece uma temporada de entretenimento. Muita gente morrendo, o confinamento... Meu pai tem 85 anos. Estou há um ano e pouco sem poder abraçar o meu velho. Encontro com ele apenas pela janela. Aquele ombro a ombro para ver o nosso Galo não está rolando. E isso é muito caro. A gente vai tocando a vida, mas o preço é alto. O mundo precisa voltar em algum momento. Já tivemos prova que somos capazes de fazer isso até pelas vacinas já produzidas em tempo recorde. O futebol, que é um evento especial para nós, é linha de frente nessa questão. Ele não vai sobreviver muito tempo sem público. Portanto, temos demandas muito fortes para solucionar. E isso cabe a todos os segmentos, do casamento aos grandes shows, passando pelo futebol, seminários, eventos ambientais... Barcelona fez um evento-teste para 5 mil pessoas e foi exitoso. A conexão com o mundo nos proporciona entender o que todos estão fazendo. Não é uma demanda solitária nossa. O mundo está tentando inventar uma nova roda. E o mundo quer que a coisa volte.

Quem mora em BH sabe que nos últimos anos, a cidade experimentou uma explosão de opções culturais de todo tipo. Mas, com a pandemia, alguns equipamentos sucumbiram à situação. Acha que BH irá retroceder alguns anos?

Quando você começa a beber vinho, você costuma beber o mais barato e, muitas vezes, ele acaba dando dor de cabaça, porque você é jovem e tem pouco dinheiro. Com o passar do tempo, quando você consegue um pouco mais de dinheiro e insiste em procurar vinhos melhores, irá descobrir que um bom vinho te proporciona um prazer muito grande, e sem dor de cabeça. Agora, se o dinheiro faltar não quer dizer que você vai voltar a tomar vinhos ruins. Você pode parar de beber por um tempo, ou beber menos, mas o seu paladar já está apurado. E é muito sofrido você abrir mão daquele paladar mais apurado por um inferior. Essa metáfora serve para a questão dos eventos. Tenho muito orgulho de ter participado desse processo da inserção de BH no calendário nacional. Posso dizer que, hoje, temos bons equipamentos culturais e excelentes produtores. Toda a nossa força produtiva vai se empenhar em uma retomada. Acredito que vamos sofrer com uma diminuição de eventos, mas toda a cadeia vai estar produzindo para retomarmos, no mínimo, do lugar que a gente parou. Produtor é um bicho danado, viu?

Acredita que a pandemia vai mudar a forma de como consumimos cultura?

Quando falamos da área de eventos o leque é muito grande. Tem certas coisas que a humanização é imbatível. Não existe live, para mim, que substitua um bom show presencial. Porém, um bom evento on-line pode ter um alcance bem maior do que teria no modo presencial. Por que não ofertar também aquele conteúdo que está sendo gerado no presencial para o público on-line? A parte do calor humano é imbatível, mas a gente aprende que existem também outras formas de fazer. Um seminário, por exemplo, que a gente primava em fazer sempre presencial, funciona muito bem no formato on-line. Posso "trazer" o Elon Musk (terceiro homem mais rico do mundo, dono de, entre outras empresas, da Tesla Motors) e ganhar 15 minutos com uma fala dele, algo que tradicionalmente, em um evento presencial, dificilmente conseguiria. Estamos aprendendo. Estamos tendo grandes ganhos tanto do ponto de vista da forma de exibir quanto do de produzir. Eu sou essencialmente otimista. Na vida, sempre temos motivo para chorar ou vender lenço. Sou libanês, quero sempre vender lenço (risos).

(foto: Uarlen Valério/Encontro)
(foto: Uarlen Valério/Encontro)
Qual foi o seu aprendizado durante o tempo em que assumiu funções no setor público?

Sou filho de funcionário público. Meu pai trabalhou na secretaria da fazenda durante a vida toda. Quando menino, ia muito para o trabalho dele. Tinha a percepção que aquelas pessoas não eram felizes. Quando eu ia a uma repartição pública resolver algum problema de uma conta errada, por exemplo, era um sofrimento. Então, eu abominava a possibilidade de ser um servidor público. No entanto, sempre fui muito crítico. Quando fui convidado a assumir a Belotur, pensei que criticar era fácil e eu acreditava que poderia fazer diferente. Mas não fiz sozinho. Era um governo novo e tinha todo o apoio do meu chefe máximo (o prefeito Alexandre Kalil). O que eu fiz foi juntar as pontas que estavam soltas. O carnaval, por exemplo, já era um sucesso, mas estava desamarrado. Um evento dessa proporção não pode ser 100% bom. Ele traz dores também. Por isso, não nos reuníamos só com os blocos, mas com os moradores, associações de bairro e com a igrejas, por exemplo.

E no Ministério do Turismo, também "juntou as pontas"?

Sim. Em um dado momento descobri, por exemplo, que as acomodações de barco-hotel no país não eram reconhecidas como hospedagens. Veja só. O que eu fiz foi regulamentar isso, o que traz uma oportunidade de aumentar o turismo estrangeiro. Então é isso. Não inventei a roda. É preciso entender as dores das pessoas envolvidas e juntar as pontas. Tanto no Ministério quanto na Belotur continuei fazendo a mesma coisa que eu fazia com os meus negócios. E quando você chega em um lugar em que as pessoas estão viciadas em um modelo ruim e você oferece uma nova experiência de gestão, a coisa funciona. Quando estava nesses cargos sempre falava que potencialidade não enche prato. Não importa se o Brasil tem o potencial para isso ou aquilo, temos é de trabalhar.

E por que trabalhar com produção cultural?

Poderia dar várias repostas para essa pergunta, mas a verdade é que quando eu era adolescente, sempre fazia umas festinhas para ganhar dinheiro. E o intuito era de reforçar o orçamento para aproveitar mais as férias. E eu tinha alguns amigos que na adolescência já trabalhavam nas empresas da família e eu morria de inveja, pois eu não tinha essa grana que eles tinham. Já tive fundição de joias, delicatessen, bar na praia... Quando me veio o convite para assumir a produção do Giramundo, pensei: "poxa, não saco muito de cultura, nem leio jornal direito" (risos). Mas isso me possibilitou uma abertura muito grande. Fritei umas três noites seguidas e escrevia muito. Sabia que estava para tomar uma decisão que poderia ser para a vida toda. E foi só decidir. E depois veio a música, com o Pato Fu. Então foi tudo acontecendo com as oportunidades, que eu abracei.

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