Como escolher bem o pet shop para banho e tosa

De tanto amar os animais, uma das mais consagradas escritoras brasileiras, Clarice Lispector, ganhou até estátua no bairro Leme, na zona sul carioca, ao lado de Ulisses, seu famoso cachorro de "olhos dourados e pelagem cor de guaraná", como a própria autora o descreveu. Há algumas décadas, ninguém cogitava que um ser de quatro patas seria alçado a tamanha honraria. Nas acanhadas prateleiras dos pet shops dos anos 1980, só se vendia coleiras, guias, comedouros, bebedouros e escovas. Remédios, só de gente, já que os medicamentos veterinários eram escassos. Em São Paulo, a Chic Dog, terceira loja do ramo a abrir na cidade, comercializava pescoço de frango e carne de boi moída e congelada para que os donos, que mal conheciam ração, pudessem alimentar os seus pets.

O serviço de banho e tosa só surgiu anos depois, na década de 1990, e de simples cuidado com a higiene dos bichos, ganhou status de luxo, com tosadores metamorfoseados em groomers e empenhados em surpreender nos serviços voltados para a estética animal que, por sua vez, passou a considerar as particularidades e necessidades de cada espécie e raça. Com isso, o que antes era raridade virou febre no país. Em 2021, o faturamento do setor pet cresceu 27%, chegando à cifra de 51,7 bilhões de reais, segundo levantamento do Instituto Pet Brasil. O chamado pet care, que abrange produtos de higiene e bem-estar, foi responsável por 5,4% do mercado e 19,5% de crescimento, chegando a 2,8 bilhões de reais.

A pesquisa apontou ainda que os principais responsáveis pela demanda de produtos para animais de estimação são pequenos e médios pet shops que juntos representam uma fatia considerável das vendas do setor (48%). Com a popularização dos serviços, no entanto, surgiram também profissionais despreparados para lidar com a bicharada. À medida que novas lojas foram sendo abertas, o número de reclamações dos tutores foi se tornando mais comum e preocupante. Na internet, os relatos vão desde animais com ferimentos feitos na hora da tosa a graves alergias em consequência do uso de produtos de baixa qualidade, uso de violência durante o processo de banho e tosa, fraturas, fuga e até morte do animal.

Especialista em cinofilia, ciência que estuda o comportamento canino, saúde e aperfeiçoamento das raças, Adriana Duarte, sócia do pet shop Zeluz, alerta que é preciso conhecer a fundo as necessidades de cada raça, o seu temperamento, tipo de pelagem e especificidade de cada tipo de pele, para então definir qual o produto a ser utilizado e a tosa mais adequada para cada pet. "São cuidados fundamentais para evitar alergias, lesões de pele e traumas nos animais", diz. Ela orienta que é preciso ser cauteloso na escolha dos produtos para banho, tomando cuidado para que não retirem toda a camada de proteção da pele, o que levará à descamação e a deixará ainda mais sensível. O resultado será o surgimento ou agravamento de problemas dermatológicos como alergias e coceiras. "Outro cuidado que adotamos para evitar a contaminação de um animal para outro através das lâminas da máquina de tosar, é sempre optar por tosas feitas apenas com tesoura."

Seja nos equipamentos de banho e tosa, seja no ambiente onde os procedimentos são realizados, a higiene é parte fundamental do processo. Além da limpeza diária, semanalmente os espaços devem ser desinfetados com produtos específicos que higienizam sem oferecer riscos aos animais. "A assepsia correta e lubrificação das lâminas utilizadas nas máquinas, assim como de mesas, gaiolas e demais objetos utilizados, garante a saúde e bem-estar dos bichinhos", diz Lucas Alves da Cruz, gerente da Puro Afeto da rede Dog’s Shop. No local, os tutores podem acompanhar os procedimentos presencialmente ou via vídeos. "Todos os nossos serviços são gravados."

Caso o animal esteja contaminado com pulgas e carrapatos, o uso de produtos para combater os parasitas deve ser seguro e com a anuência do dono. Para evitar quedas das mesas de trabalho, o pet jamais deve ser deixado sozinho e fora das guias de contenção. Os tosadores devem ser qualificados e treinados para não causar nenhum dano ao bicho, entre eles queimaduras na pele ao utilizar o secador. Eles também precisam estar sempre atentos a qualquer alteração identificada, como nódulos e alergias, para que os tutores sejam informados. "Temos um checklist que acompanha o pet da entrada à saída", diz a empresária Nathália Minzon, da Pimp My Pet. "Fazemos uma análise prévia, anotamos os serviços solicitados pelo tutor e, caso alguma necessidade seja identificada durante o processo, entramos em contato para autorização prévia."

A segurança do espaço deve ser reforçada com portões extras que dificultem o acesso do animal à rua e previnam fugas. Mas nada disso fará a diferença se os profissionais do local não gostarem realmente de bicho. Só assim saberão entender seus medos e respeitar o seu tempo. "Não adianta ter habilidade e não gostar do que faz. É preciso ser ainda mais cuidadoso com animais medrosos ou traumatizados, estabelecendo uma relação de carinho e confiança", diz a médica veterinária Mayumi Mano, da clínica Patativas. No caso de animais mais agressivos, os profissionais devem avaliar a viabilidade do procedimento para não colocar em risco a sua própria segurança e buscar entender qual a motivação do comportamento. "Quando necessário, fazemos o banho por etapas. E sempre que percebemos o animal estressado ou muito desconfortável, aguardamos para que se tranquilize", diz a veterinária. Os pets shops não estão autorizados a sedar o animal, a não ser em casos específicos e com autorização prévia do dono e prescrição e acompanhamento de médico veterinário. Não menos importante, é lembrar que bons insumos são caros e o barato pode sair caro, especialmente para o seu animal de estimação.