Estado de Minas ARTIGO

O que é a normose e como sair dela

Ansiedade, irritabilidade e estresse constante são algumas das consequências da normalidade doentia


postado em 05/10/2022 22:40

(foto: Freepik)
(foto: Freepik)
Por Louis Burlamaqui - Quando jovem, no segundo grau do colégio, eu precisava estudar diversas matérias ao mesmo tempo. O volume era imenso e meu entusiasmo não correspondia à necessidade de obtenção das notas. De forma intuitiva ou até mesmo por um sistema de defesa não consciente, eu deixava para estudar sempre em cima da hora de uma prova. Não que isso fosse o certo ou a regra, mas de certa forma isso funcionava para mim. Muitos anos depois, analisando meu comportamento, percebi que deixando para estudar em cima da hora, eu memorizava com mais facilidade e com isso reproduzia o conhecimento exigido. Esse processo, que acabou virando um padrão em minha vida, me facilitou concluir os estudos do segundo grau, me levou para a universidade, mas me criou um grande problema. Passou a ser normal em minha vida, deixar as coisas em cima da hora, me atrasar em compromissos, cumprir projetos e tarefas no último segundo. Minha lista de afarezes sempre estava entupida, uma vida corrida e com a sensação de deixar o dia com coisas para trás. Essa vida que para mim era normal, muitos anos depois eu descobri que me causava diversos problemas: eu não tinha produtividade, baixa performance, não era estratégico, pois entrava muito em questões operacionais, tinha muita ansiedade, procrastinava, etc. Essa normalidade que me afetava tem nome e é uma doença: normose.

Cunhada por Jean Ives Lelup, Pierre Weil e Roberto Crema, a normose é a patologia da normalidade. A normalidade doentia, a doença do século XXI.

Eu me curei desta doença há mais de 20 anos. É uma doença psicossomática. Raras são as pessoas que conseguem perceber as normoses em suas vidas. Ao longo dos anos, eu pude entender profundamente sobre as normoses pessoais, organizacionais, assim como da sociedade que também está lotada.

Quando vemos pessoas nas ruas pedindo dinheiro e nos acostumamos pensando “estamos no Brasil, é assim mesmo”, quando forçamos jovens a decorar para passar na prova, quando chefes mantém o sistema de controle e obediência de seu time e espera que sejam criativos e inovadores, quando compramos presentes no Natal porque é a época de dar presentes e no dia seguinte tratamos mal nossos familiares, quando pagamos por um chocolate na Páscoa cinco vezes mais pelo mesmo sabor, quando encontramos no álcool o relaxamento, isso são normoses. São centenas de normoses.

O sistema social força as pessoas a caírem em um padrão socialmente aceito, para se sentirem parte, sem perceber que a normose tira delas a capacidade de serem elas mesmas em sua máxima versão. A normalidade doentia e viciante traz diversas reações como:

  • Ritmo acelerado e ansiedade
  • Fácil irritação e estresse constante
  • Falta de fé e esperança - depressão
  • Excesso de crítica e negativismo
  • Sensação que conquistei tudo mas falta alguma coisa
  • Altos e baixos emocionais
  • Esforço e luta para obter resultados

Muitas pessoas não estão conseguindo sair destes padrões que impedem de ver a vida com amplitude e clareza, mata a criatividade e gera doenças.

Para começar a sair da normose, sugiro algumas ações que vi dar certo com diversas pessoas e organizações: observe as coisas que se repetem negativamente, se tem padrão tem normose, experimente viajar para conhecer outras culturas, conheça e conviva com pessoas bem diferentes de você desde que não fira seus valores, aprenda coisas novas de verdade e seja um eterno aprendiz, passe a questionar o porque de tudo, busque autoconhecimento e aceite feedback, faça trabalhos que exijam humildade para desenvolver sensibilidade, desenvolva uma mente consequente e consciente.

Um peixe só sabe que está na água quando sai da água.

Sair da normose é sair da alienação e deixar de ser um zumbi social.

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